OITO NATAIS

Quando você se foi, eu não parei de te contar as histórias
da minha vida. Mas você deixou de responder e todas as histórias
que eu te conto são para ouvir
o que você tem a me dizer.

Agora são oito natais sem você.

São oito natais em que eu te digo o que penso
e busco nas minhas lembranças
o tom da sua voz, o jeito como você
diz cada palavra,
como me chama pelo nome:
meu filho.

Tenho medo de esquecer a sua voz,
porque a segunda morte
é a morte da memória perdida.

A primeira morte
é a morte da possibilidade de novas memórias:

A cada novo natal (um, dois, três, agora são oito) é um novo natal
sem você,
sem que as zero horas
eu pegue o celular para te dizer
que nós somos muito parecidos
e que nós somos absolutamente diferentes
e que é difícil viver com você
mas viver sem você é quase impossível,
porém, eu continuo vivendo
e esse é o meu presente.

A cada novo natal (agora são oito) é um novo natal
em que a sua imagem na minha mente
fica mais distante
diante das novas imagens de um dia a dia
em que a sua presença se faz sempre
pela ausência.

Agora são oito natais em que o café que eu tomo
logo após acordar
não foi feito por você, que nunca tomou café
e nunca errou a medida.

A memória é um organismo que se renova
no tempo — agora são oito natais, mas para mim
parece o primeiro.

O tempo da saudade é outro tempo.

No tempo da saudade eu ainda me pego distraído
pensando que amanhã vou te ver.

No tempo da memória eu temo
não te reconhecer
nos meus sonhos, em que você nunca diz nada
num silêncio dolorido.

No tempo do futuro eu temo
não te reconhecendo
deixar de me reconhecer.

São oito natais sem você
e são oito natais em que eu sou um outro eu,
feito da soma do que falta e de um impreenchível vazio.

Agora são oito natais e já não dói mais. Já não dói há alguns natais.

Não é dor o nome do que eu sinto:

Imagine uma carta importante
que é remetida
sem nunca chegar ao seu destino,

Agora são oito natais e a carta continua perdida. É assim que eu me sinto.